APRESENTAÇÃO
Pura Lúcia Oliver Martins
As discussões em torno do aluno-sujeito, historicamente situado, portador de uma prática social a ser considerada pela escola, assumem centralidade nos meios escolares entre seus agentes e nos meios acadêmicos entre os estudiosos da área, nos últimos vinte e cinco anos. Assiste-se, sobretudo na década de oitenta, a uma intensificação dos movimentos sociais que criam novas formas de luta e influenciam sobremaneira a organização do trabalho pedagógico dos professores, a concepção de formação escolar e o significado social da escola.
Nesse período, é marcante a definição de políticas públicas de educação em nível nacional, estadual e municipal, numa perspectiva inclusiva e democrática, valorizando o trabalho coletivo na constituição dessa nova escola, como a Escola Plural de Belo Horizonte-MG, a Escola Cidadã de Porto Alegre-RS, a Escola Balaia de Belém-PA, a Escola Candanga de Brasília-DF e a Escola Sem-Fronteiras de Blumenau-SC, entre outras.
As concepções de educação/escola dessas propostas colocam a prática social dos seus agentes — professores e alunos — no centro de sua organização, tendo em vista o desenvolvimento de uma formação crítica e comprometida com a realidade social em que se inserem.
Com efeito, nesse período, as produções teóricas dos educadores vão expressar tentativas de responder a essas novas exigências. Muitos estudos e pesquisas centrados na prática pedagógica das escolas, sobretudo de Ensino Fundamental, desenvolvem alternativas para o ensino voltadas para a lógica, os interesses e as necessidades práticas de boa parte dos sujeitos que constituem a escola.
No bojo das discussões acerca dessas novas proposições pedagógicas, uma questão fundamental do processo de ensino-aprendizagem ganha especial destaque: a avaliação. De uma abordagem centrada no professor, baseada na verificação do desempenho dos alunos numa perspectiva de contabilização dos resultados, a avaliação avança para uma abordagem centrada naquele que aprende, baseada no processo, numa perspectiva de avaliação formativa, tendo em vista a melhoria da aprendizagem em curso.
O trabalho de Wagner dos Santos, Currículo e Avaliação na Educação Física: do Mergulho à Intervenção, que em boa hora vem a público, situa-se nesse movimento e inscreve-se no grupo de estudos comprometidos com a busca de possibilidades práticas para atender aos interesses da maioria da população brasileira presente nas escolas públicas. O autor apresenta um estudo original e polêmico sobre avaliação em Educação Física Escolar, tema pouco explorado e de extrema relevância para os profissionais da área.
A riqueza e a originalidade deste livro estão na ousadia do autor de enfrentar o desafio de ir além do discurso para buscar coerência entre prática e teoria. Partindo do pressuposto de que o principal problema da avaliação educacional não está na assimilação de novos referenciais teóricos e, sim, na vivência concreta desses pressupostos, o autor desenvolve um estudo que leva uma contribuição para a prática dos sujeitos da pesquisa, não apenas após sua conclusão, mas durante o todo o processo. Para tanto, Wagner percorre um itinerário na constituição do seu objeto de estudo e na definição da metodologia da pesquisa, descrito com muita propriedade na introdução e no primeiro capítulo do livro. Em seguida, apresenta a proposta pedagógica da escola onde o estudo se realiza, fazendo uma cuidadosa contextualização da proposta curricular em rede — orientação construída a partir das experiências vivenciadas pelos sujeitos da escola compartilhada — e sua realização no cotidiano da escola. Finalmente, propõe alternativas que possibilitam, na prática, a vivência, análise e sistematização coletiva dos processos de avaliação, fundamentadas por um referencial teórico, tendo em vista a transformação dos sujeitos participantes desse processo.
Assim, além de oferecer uma reflexão teórica de envergadura, o livro de Wagner dos Santos traz também uma experiência metodológica que permite acompanhar um fazer na perspectiva de sistematização coletiva do conhecimento. Não, porém, para ser tomada como um manual de avaliação, mas como alternativa de proposição de novas práticas de avaliação na Educação Física Escolar, produzidas e sistematizadas pelos agentes da escola na e pela prática. Com esse sentido, considero o texto de Wagner dos Santos fundamental para todos aqueles que se preocupam com a formação do professor e com uma educação mais comprometida com os interesses e necessidades da maioria da população. Da mesma forma, sua leitura é essencial para os que pretendem desenvolver um trabalho de pesquisa-ação. Trata-se, sem dúvida, de um dos bons exemplos dessa modalidade de pesquisa.
Espero, assim, que, estimulados pela leitura deste livro, outros estudiosos do assunto se integrem nessa difícil, mas fascinante, tarefa de ultrapassar o nível do discurso e buscar práticas avaliativas consistentes e coerentes com as necessidades atuais. E que os professores, de modo geral, especialmente aqueles que atuam na Educação Física Escolar tenham, na leitura desta obra, um referencial rico para repensar suas práticas a partir da estreita articulação do ato de ensinar/avaliar com as necessidades educacionais postas pelo processo de transformação social a que assistimos neste início de século.