SCHNEIDER, O. ; FERREIRA NETO, Amarílio ; SANTOS, Wagner dos . Autores, atores e editores: os periódicos como dispositivos de conformação do campo científico/pedagógico da educação física . In: XIV Congresso Brasileiro de Ciência do Esporte e I congresso Internacional de Ciências do Esporte, 2005, Porto Alegre. Educação Física e Ciências do Esporte: ciências para a vida. Porto Alegre : Colégio Brasileiro de Ciencias do Esporte, 2005. v. 1.
AUTORES, ATORES E EDITORES: OS PERIÓDICOS COMO DISPOSITIVOS DE CONFORMAÇÃO DO CAMPO CIENTÍFICO/PEDAGÓGICO DA EDUCAÇÃO FÍSICA
Omar Schneider
Doutorando em Educação - PUC/SP Programa de Pós-Graduação em Educação: História, Política, Sociedade
Amarílio Ferreira Neto
Professor na Universidade Federal do Espírito Santos - Departamento de Desporto
Wagner dos Santos
Mestre em Educação - FAE/UFMG Programa de Pós-Graduação em Educação
Membros do Instituto de Pesquisa em Educação e Educação Física - PROTEORIA
RESUMO: Aborda a imprensa periódica da Educação Física, projetando essa como um dispositivo de organização do campo. Utiliza como referencial teórico-metodológico as reflexões de Roger Chartier em relação à História do Livro e das Edições para dar a ver as práticas implementadas pelos editores da imprensa periódica na produção de estratégias editoriais de circulação de autores, de temas e prescrições educacionais nas décadas de 1930 e 1940, com a revista Educação Physica e nas décadas de 1980 e 1990, com a revista Motrivivência.
Palavras-chave: editores; estratégias editoriais; imprensa periódica da Educação Física
AUTHORS, ACTORS AND EDITORS: PERIODICALS AS DEVICES OF PEDAGOGICAL/SCIENTIFIC CONFORMATION FIELD OF PHYSICAL EDUCATION
ASTRACT: It talks about press, the Physical Education periodicals, projecting it as a field organization device. It uses as theoretical-methodological references the Roger Chartier reflections about Editions and Books History to show the implemented practices by the periodical press editors in production of circulating authors editorials strategies, of educational themes and prescripts during 1930 and 1940, with the Physical Education magazine and in 1980 and 1990 with Motrivivência magazine.
Keywords: Editors. Editorial strategies. Physical Education periodicals.
AUTORES, ACTORES Y EDITORES: LOS PERIÓDICOS COMO DISPOSITIVOS DE CONFORMACIÓN DEL CAMPO CIENTÍFICO PEDAGÓGICO DE LA EDUCACIÓN FÍSICA
RESUMEN: Aborda la imprenta periódica de la Educación Física, proyectando esa como un dispositivo de organización de campo. Utiliza como referencial teórico metodológico las reflexiones de Roger Chartier en relación a la Historia del Libro y de las Ediciones para dar a ver las prácticas implementadas por los editores de la imprenta periódica en la producción de estrategias editoriales de circulación de autores, de temas y prescripciones educacionales en las décadas de 1930 y 1940, con la revista Educação Physica y en las décadas de 1980 y 1990, con la revista Motrivivência.
Palabras claves: editores; estrategias editoriales; imprenta periódica de la Educación Física
Introdução
O estudo tem por objetivo trabalhar com um tema pouco explorado na história da Educação Física, qual seja, o papel dos editores de impressos periódicos na produção do campo da Educação Física, para tanto utiliza como fonte duas revistas, uma que circulou no primeiro quartel do século XX e outra que abrange os últimos vinte anos do mesmo século.
A primeira revista utilizada como fonte é a revista Educação Physica, periódico produzido no Rio de Janeiro, por iniciativa de dois professores de Educação Física, Paulo Lotufo (editor no período de 1932 a 1945) e Oswaldo Murgel Rezende (editor no período de 1932 a 1944). Posteriormente a esses dois editores, somam-se Roland de Souza (editor no período de 1936 a 1941), e Hollanda Loyola (editor no período de 1939 a 1944).
Nos treze anos em que o periódico circulou, foram lançadas 88 revistas. Dessas, dois exemplares foram publicados em edições conjugadas em um mesmo volume, a de número 28/29 e a de número 79/80.
O segundo periódico é a revista Motrivivência, impresso especializado sobre Educação Física lançado em dezembro de 1988. Até o ano de 2005, foram publicados 21 exemplares. A revista se caracteriza como uma revista cientificapreocupada com tematicas relativas à pratica pedagógica, com a discussão epistemológica e política da Educação Física. Foi criada originalmente para ter uma periodicidade semestral, conforme consta na edição do seu primeiro número. Contudo, acabou por possuir uma periodicidade anual, com uma certa irregularidade, ja que, em 1990, sua publicação foi interrompida, retornando em 1993 com três números em conjunto. A partir do n. 12 (1999), dois números estão sendo editados por ano.
Pode-se considerar que, até o momento, a revista Motrivivência possui duas etapas, uma sergipana e outra catarinense. Uma em que o impresso esteve sediado na Universidade Federal de Sergipe (etapa sergipana) e outra em que passou a ser editado na Universidade Federal de Santa Catarina (etapa catarinense), sob a responsabilidade do Núcleo de Estudos Pedagógicos da Educação Física (NEPEF) do Departamento de Educação Física. Na primeira etapa da revista (n. 1, 2, 3 e 4), o principal editorfoi o professor Maurício Roberto da Silva, com o auxilio do professor Nelson Dagoberto de Matos nos exemplares n. 1, 2 e 3. Na segunda etapa do periódico, outras pessoas passam a assinar o editorial conjuntamente com o editor. São eles(as): professoras Albertina Bonetti e Iara Regina Damiani (n. 14); professor Giovani Del Lorenzi Pires (n. 15, 16, 17, 18 e 19).[1]
Em relação à revista Educação Physica pode-se verificar que ja foi objeto de dois estudos. O primeiro desenvolvido por Goellner (1999), trabalha com as imagens veiculadas na Revista,discutindo os tratamentos dispensados ao corpo feminino nas décadas de 1930 e 1940 e o segundo produzido Schneider (2003), estuda o periódico prestando atenção aos dispositivos editoriais, as prescrições relacionadas as formas de ler e usar o impresso na formação e atualização docente entre os anos de 1932 a 1945.
A revista Motrivivência ja foi examinada em quatro aspectos de sua materialidade. Ferreira Neto e Nascimento (2002), tiveram como objetivo discutir os critérios de cientificidade na produção do impresso. Ventorim e Ferreira Neto (2003), procuraram examinar o periódico prestando atenção à produção do conhecimento sobre a prática de ensino e o estágio supervisionado em Educação Física.Ferreira Neto et al. (2003),[2]procuraram compreender o aparelho crítico[3]do periódico, qual seja, a organização da leitura tanto no sentido da sua didatização, como do controle dos sentidos que podem ser extraídos do material impresso e o debate sobre a graduação em Educação Física. O quarto estudo centra-se na revista Motrivivência para debater a necessidade de criar na área da Educação Física inventários de fontes para subsidiar pesquisas nas áreas das Ciências Sociais e da História.
Enfocar novos ângulos em um terreno há muito visitado não é tarefa fácil, requer que novas categorias sejam construídas, para que velhos objetos apresentem faces ainda pouco exploradas ou inexploradas. Conforme Hunt (1995), a esfera da cultura[4]é indicada como um locusprivilegiado, pois nela se pode ter contato com mundos que ainda necessitam ser compreendidos. Nesse sentido, a dimensão cultural torna-se ambiente profícuo para se compreender o campo educacional e a História da Educação Física, uma vez que não existe “[...] uma dimensão extracultural da experiência” (HUNT, 1995, p. 9).
De acordo com Nunes (1992), essa nova forma de fazer pesquisa prioriza o exame dos objetos investigados, utilizando como referência a cultura, o que passa a remeter o pesquisador ao tratamento do objeto pela sua materialidade, seu entendimento como prática de representação e “[... ] dispositivos, através dos quais bens culturais são produzidos, postos a circular e apropriados” (NUNES; CARVALHO, 1993, p. 44).[5]
Visualizar o material impresso como dispositivo permite observá-lo como representação, mas representação que não está envolta por uma aura de neutralidade, pois, segundo Chartier (1991), é preciso que se observe que essas representações são coletivas, o que pressupõe que estejam sempre em concorrência e em competição, o que faz com que se considere que são “[...] matrizes de práticas construtoras do próprio mundo social” (CHARTIER, 1991, p. 183).[6]
Imprensa periódica: autores, atores e editores
Ao analisarmos as características materiais da imprensa periódica, principalmente na revista Educação Physica e na revista Motrivivência, prestamos atenção para um aspecto pouco explorado nos estudos que discutem a constituição do campo da Educação Física, qual seja, o papel desempenhado pelos editores de revistas científico/pedagógicas. A sensação de que para compreender a História da Educação Física, novos objetos devem ser colocados em evidência, não nasce por acaso, mas do acumulo de estudos desenvolvidos, no âmbito da 1011Históriae da História da Educação. Estudando a revista Educação Physica Schneider (2003) trabalhou perspectivando as estratégias editoriais colocadas em ação pelo grupo de intelectuais que se autodenominavam nas décadas de 1930 e 1940, como apóstolos da Educação Física no Brasil. Ao mesmo tempo em que eram autores, assumiam também a função de editores do impresso.Ao criar estratégias editoriais como recurso de didatização e controle da leitura os editores produziam a imagem de um grupo organizado, representação necessaria como meio de reivindicar espaço de atuação como professores de Educação Física.
Muitos dos professores envolvidos com o ensino da Educação Física no Brasil não tinham o curso superior ou o secundario, uma das condições para registrar o diploma na Divisão de Educação Física do Ministério da Educação. Mesmo um dos diretores da revista Educação Physica, Paulo Lotufo, não preenchia os requisitos exigidos, pois sua formação tinha se dado no Instituto Técnico de Educação Física da Associação Cristã de Moços da América do Sul, em Montevidéu. Também onze, das 33 pessoas listadas como colaboradores em 1938, não preenchiam os requisitos exigidos, uma vez que seus diplomas, além de terem sido adquiridos em outro país, outorgavam-lhes apenas a condição de técnicos.
Na tentativa de reverter o quadro que se apresentava, de acordo com eles, a revista
‘Educação Física’ foi [...] [a] principal tribuna. [...] Não era justo que aqueles mestres esforçados, que por tantos anos tinham demonstrado indescritível competência no exercício do seu magistério, fossem agora tolhidos de exerce- lo (EDUCAÇÃO FÍSICA, 1943, n. 74, p. 1).
Percebe-se que o impresso se tornou instrumento estratégico para que os editores fizessem valer sua voz como força autorizada para intervir nos órgãos educacionais em favor dos professores de Educação Física, ainda que esses professores fossem eles mesmos.
Ao que parece, o Decreto-lei n°. 2.028 (referente ao registro de professores) tornou-se um empecilho para uma boa parte dos professores ligados à revista Educação Physica, que, por não conseguirem registrar-se como professores no Departamento Nacional de Educação, em função de terem feitos seus cursos fora do Brasil, em uma instituição que não fornecia certificado nem secundário, nem superior, mas técnico, perderiam o statusde líderes da Educação Física no Brasil, representação que vinha sendo desenvolvida desde o lançamento da revista número 7 (1936), exemplar no qual os editores passam a veicular o nome de personalidades da Educação Física brasileira e internacional como colaboradores do impresso. Estes são chamados de os Leaders do movimento da educação physica no Brasil.São eles: Major Barbosa Leite, Fernando de Azevedo, Francisco Campos, Fred C. Brown, Henry J. Sims, James Summers, General Newton Cavalcante e Capitão Orlando Eduardo Silva.
O uso que os editores fazem dos nomes de personalidades/autoridades consideradas por eles como os elementos representativos da Educação Física no Brasil faz-nos voltar a atenção às reflexões de Pierre Bourdieu em relação às suas teorizações sobre o capital simbólico. Para o autor (1990, p. 35), “[...] as lutas pelo reconhecimento são uma dimensão fundamental da vida social” e nasce da percepção de que existe um jogo a ser jogado, no qual “[...] está em jogo a acumulação de uma forma particular de capital” (BOURDIEU, 1990, p. 36). Desse modo, capital simbólico projeta-se como possibilidade de “[...] ser conhecido e reconhecido [o que] também significa deter o poder de reconhecer, consagrar, dizer, com sucesso, o que merece ser conhecido e reconhecido” (BOURDIEU, 2001, p. 296).
Importante perceber que os editores põem-se na condição de decisores, deliberando por meio do impresso quem deve ser conhecido e reconhecido pela sua comunidade de leitores como os líderes da Educação Física no Brasil. Esse movimento é importante, porque, além de o periódico passar a compartilhar do capital simbólico que as personalidades eleitas como os líderes já possuem, porquanto são figuras atuantes do meio político-educacional, também projeta a Revistacomo um lugar de fala autorizada, o que se configura como uma táticaem meio às estratégiasdos concorrentes.
Ao estudar a revista Motrivivência dando ênfase à sua fórmula editorial, também foi possível perceber, a intervenção dos editores na conformação do campo da Educação Física nas décadas de 1980 e 1990.
O período em que a revista Motrivivência nasce pode ser considerado como um momento muito importante para a Educação Física. Na década de 1980, realiza-se o diagnóstico de que a Educação Física estava em crise, ou necessitava entrar em crise, a tentativa, então, era a de superar o modelo que a ela dava suporte.
Se perspectivarmos que uma modalidade de discurso que animou o debate de parte dos intelectuais da Educação Física, na década de 1980 e início da década de 1990, foi o discurso politicamente engajado, que buscou tratar predominantemente da função da Educação Física na escola a partir de uma teoria crítica da sociedade, podemos considerar que a revista Motrivivência configura-se como uma síntese das discussões produzidas nos últimos quinze anos.
Ao trabalhar dando ênfase ao aparelho crítico do impresso, pode-se perceber a figura do(s) editor(es), de maneira mais forte, atuando em um dispositivo muito importante na constituição da fórmula de um projeto editorial, qual seja, os editoriais.Por meio desse dispositivo, o(s) editor(es) fala(m) com os leitores, indica(m)-lhes por qual registro as matérias selecionadas deverão ser lidas, interfere(m) no que é publicado ao recortar e adicionar sentidos ao pensamento dos autores, muitas vezes distantes do que foi proposto originalmente nos textos. Enfim, nos editoriais, o(s) editor(es) se capacita(m) como voz autorizada a aproximar os vários assuntos tratados no impresso, ao mesmo tempo em que indica(m) protocolos de leituras para o que foi pelo conselho Editorial, previamente selecionado, como digno de ser conhecido pelos leitores.[7]
Outro local em que pode se perceber as estratégias implementadas pelos editores são as capas produzidas para o impresso.[8]As capas produzidas para a revista Motrivivência funcionam como uma marca de identificação muito forte do projeto editorial concebido para o periódico. Desde a primeira revista publicada, até o n. 19 (2002), percebe-se esse dispositivo fazendo parte da constituição do seu aparelho crítico, o qual atua de duas maneiras, uma confere identidade ao impresso, a outra, decorrente da primeira, configura-se como a busca de controle sobre as expectativas do leitor em relação ao conteúdo veiculado. Assim, o impresso aponta aos leitores os problemas que existem na Educação Física brasileira. Por meio das imagens veiculadas informa-se ao leitor sobre o tipo de leitura que ele irá encontrar, uma leitura crítica, politizada, sem ser partidária, que fala sobre os problemas enfrentados pela Educação Física de uma forma irônica e bem humorada.[9]
Ao que tudo indica, a revista Motrivivência, possui uma política editorial que marcadamente valoriza a difusão do conhecimento produzido em diferentes instâncias, o que pode ser verificado no modo com que se articulam os objetivos das seções do impresso. Esse papel, na criação das seções, e sua delimitação dão ao editor de impressos científicos- pedagógicos o poder de decidir o que é ou não necessário aos leitores e, ao mesmo tempo, procura constituir os leitores, uma vez que, nesse processo de criação e organização do que é ou não pertinente veicular, procura-se esquadrinhar os próprios leitores, suas expectativas e aptidões de leitura, e ainda as demandas de trabalhos publicáveis. Nesse sentido, o papel do editor ou editores que lidam com a imprensa periódica deve ser colocado em discussão ao se tratar da constituição do campo da Educação Física.
Como estratégia de luta e produção cultural, a revista Motrivivência atua como instância privilegiada na circulação de um modelo, de um estatuto e de uma posição, pois é capaz de significar simbolicamente e de forma objetivada a existência de um grupo que procura mudar a Educação Física brasileira.
Os editores devem ser percebidos como atores importantes na forma como uma área do conhecimento se constitui, pois eles assumem posições-chave no processo de divulgação das propostas, das teorias e dos atores considerados como autorizados a falar em nome de uma comunidade.
Por fim, precisamos incluir nessa análise o papel do(s) editor(es), fornecendo oportunidades para que um grupo, constituído por atores que muitas vezes possuem orientações teóricas diferentes, seja percebido como constituído por autores autorizados a falar como autoridades sobre uma determinada temática que se julga seja capaz de preencher as expectativas e necessidades do professorado.
Considerações finais
O papel dos editores deve ser colocado em evidência, pois conforme Chartier (2002, p. 71-72) “O que quer que façam, os autores não escrevem os livros”, eles escrevem textos que outros transformam em objetos impressos. De acordo com o autor, é justamente esse hiato que deve ser compreendido, pois é justamente o espaço no qual se constrói o sentido - ou os sentidos, que foi esquecido pelos pesquisadores, ou seja, o suporte material e o papel do editor na produção dos dispositivos modelizadores da leitura.
forma das ilustrações é um recurso muito bem projetado, pois funciona como textos significativamente repletos de mensagens formadoras. A utilização contínua e alternada de charges, literatura de cordel, extratos de músicas, poesias, histórias em quadrinhos legitima, juntamente com os textos e as ilustrações, a revista Motrivivência como uma verdadeira produção artística. 19
Para Chartier (2002, p. 244), a “[...] disposição da paginação, os modos de recorte do texto, as convenções tipográficas são investidos de uma 'função expressiva' e sustentam a construção da significação”. Produzidos por uma intenção de controle e didatização as convenções tipográficas possuem produtores - editores e técnicos tipográficos - e destinatários, as comunidades de leitores. Assim falar em imprensa periódica, estratégias editoriais é mobilizar novos personagens povoando o campo das lutas simbólicas, as quais são expressas por meio do que se convencionou chamar de lutas de representação.
Ao tratar a figura do editor como um ator a ser conhecido na produção do campo da Educação Física (assim como as estratégias e os dispositivos que aciona na constituição de um projeto político-educacional), talvez, ao final da discussão, uma outra cena seja revelada e o debate em torno da renovação intelectual da area, na década de 1980 e 1990, seja ampliado. Desse modo, é possível que, quem até o momento esteve nos bastidores apareça como personagem importante para compreendermos a história recente da area. Assim, pode ser modificada a interpretação dominante (produzida por alguns estudos, como Oliveira (1994), Daolio (1997), e Caparróz (1997)), com a qual temos lidado, que apresenta o campo da Educação Física sendo constituído apenas pelos personagens mais visíveis.
Ainda existe muito a se discutir sobre a figura do editor na constituição do campo da Educação Física, uma vez que ele não ocupa a linha de frente, mas posiciona-se nos bastidores, articulando, censurando e tomando decisões sobre o que ou a quem dar maior evidência e quais tematicas devem ser privilegiadas ao ser projetada a edição de um periódico.
Referências
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1Ver artigo produzido por Ferreira Neto e Nascimento (2002) e divulgado na home page do PROTEORIA (www.proteoria.org) sobre avaliação de periódicos científicos da Educação Física.
Ver a revista n. 12, na carta ao editor, para obter mais informações sobre as duas etapas, a de Sergipe e a de Santa Catarina.
3 Nos três primeiros números, era denominado diretor.
10 No campo da História temos os estudos de Chartier (1994, 2004) que discute o papel desempenhado pelos editores de Troyes e a coleção de livros intitulada Bibliothéque Bleue,designada como o mais poderoso instrumento de aculturação escrita da França do Antigo Regime.
1No campo da História da Educação, trabalho pioneiro no Brasil é o desenvolvido por Toledo (2001), que trabalha com a Coleção Atualidades Pedagógicas,um conjunto de livros primeiramente organizados por Fernando de Azevedo e posteriormente por Damasco Penna, entre os anos de 1931 e 1979, com a chancela da Companhia Editora Nacional.
12 Lidando com as praticas editoriais implementadas pelos editores da revista Educação Physica, pode se perceber que o impresso foi utilizado como principal fórum de reivindicação dos professores que estavam ligados ao periódico.
13 Com exceção de Hollanda Loyola, professor de Educação Física diplomado pela Escola de Educação Física do exército, os outros editores e colaboradores que dão suporte à revista de Educação Physica não possuíam diploma de formação em Educação Física obtido no Brasil, mas em Montevidéu no Uruguai, na Associação Cristã de Moços.
14 Para Certeau a noção de táticaremete para o estudo das ações de grupos que estão em posição de desvantagem na luta pela organização da cultura. Enquanto estratégiaprojeta-se a partir de um lugar de poder e “[... ] designa dispositivos de normatização e modelização [... ] [que] regulam práticas que se inscrevem em um território que lhes é exterior” (CARVALHO, 2003, p. 343), o de tática,ao contrario manifesta-se em um território que não é seu, ou seja, “[... ] tem por lugar senão no do outro [...], por isso deve jogar com o terreno que lhe é imposto” (CERTEAU, 1994, p. 100).
15 Os editoriais se apresentam na forma explicativa, informativa e essencialmente problematizadora de temáticas gerais e ^p^fl^s da área da Ediicação Rs^a esp°rte e lazer.
[1] É possível, com base na observação da ficha técnica da revista, bem como em algumas referências realizadas nos editoriais, que outras pessoas também estivessem envolvidas na feitura do impresso, como professores e estudantes dos cursos de Educação Física nos quais o periódico esteve e esta sediado.
[2] Este trabalho é resultado de um esforço coletivo empreendido pelos pesquisadores do Instituto de Pesquisa em Educação e Educação Física (PROTEORIA). Para saber mais ver o número especial da revista Motrivivência (ano xv, n. 20-21, mar./dez. 2003), lançado como comemoração aos 15 anos de existência do impresso, no qual dois artigos foram publicados, um abordando a sua fórmula editorial e outro discutindo o porque de os inventarios de fontes serem necessarios para se fazer pesquisas sobre a história da Educação Física.
[3] Conforme Toledo (2001, p. 4), o aparelho crítico “[...] tem como função ou a didatização da obra ou uma sofisticação de sua apresentação [...] na qual está inserida uma proposta especifica, que orienta o leitor para uma determinada forma [...]” de se apropriar do conteúdo do impresso ou do conjunto ao qual ele pertence.
Para Hunt (1995, p. 9), “As relações econômicas e sociais não são anteriores às culturais, nem as determinam; elas próprias são campos de prática cultural e produção cultural”.
[5] Para Darnton (1997), a imprensa deve ser compreendida como uma força ativa na história, ajudando a dar forma aos eventos que registra e como um dos principais ingredientes de construção de novas culturas. Escrevendo sobre periodismo e vida urbana,Cruz (2000) diz que a palavra impressa é um dos principais lugares em que se pode verificar a disputa entre o velho e o novo. Para a autora, a imprensa coloca-se “[...] como um campo privilegiado da disputa cultural” (CRUZ, 2000, p. 81). Conforme Davis (1990, p.159), o impresso não deve ser compreendido apenas como uma fonte de informações, de idéias de imagens, mas acima de tudo como um mensageiro de relações, o qual possui como “[...] característica mais marcante [...] [o] papel de formador de opinião”.
[6] De acordo com Sirinelli (1996 e 1998), o impresso constitui-se como um locusfundamental na produção de um lugar de sociabilidade,lugar este que muitos intelectuais e militantes buscam utilizar como pólo de sociabilidade, fenômeno que se explica pela necessidade de aglutinação de forças em torno de um propósito comum. Não raro, esses núcleos acabam por anunciar sua identidade política por meio de jornais, revistas e clubes como meio de objetivar ações concretas. Ainda conforme Sirinelli, essa atitude possui por objetivo criar “microclimas ideológicos” capazes de gestar na sociedade uma certa resistência, ou mesmo estabelecer uma alteridade coletiva em relação aos demais grupos.
De acordo com Hunt (1992), os documentos com os quais o historiador trabalha descrevem ações simbólicas, não podendo ser considerados textos inocentes e transparentes. Eles foram escritos por autores com diferentes intenções e estratégias, assim os historiadores da cultura devem criar suas próprás estratégias para lê-los.
Conforme Chartier (1990, p. 179), uma imagem, uma ilustração “[...] induz uma leitura fornecendo uma chave que indica através de que figura dever ser entendido o texto”.
[9] As ilustrações que compõem o projeto editorial do impresso motivam e propõem uma leitura crítica e diferenciada e, sobremaneira, alegre do seu conteúdo. Pode-se perceber que o dispositivo objetivado na