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Artigos > Formação Profissional, Currículo e Práticas Pedagógicas em Educação e em Educação Física > LOCATELLI, Andréa Brandão; FERREIRA NETO, Amarílio; SANTOS, Wagner dos. A teoria do saber docente na educação e na educação física. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, 13., 2003, Caxambu-MG. Anais... Caxambu-MG: CBCE/Autores Associados, 2003. 1 CD-ROM.

LOCATELLI, Andréa Brandão; FERREIRA NETO, Amarílio; SANTOS, Wagner dos. A teoria do saber docente na educação e na educação física. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, 13., 2003, Caxambu-MG. Anais... Caxambu-MG: CBCE/Autores Associados, 2003. 1 CD-ROM.


A TEORIA DO SABER DOCENTE NA EDUCAÇÃO E NA EDUCAÇÃO FÍSICA

 

Andrea Brandão Locatelli Pós Graduada em Educação Física Escolar-CEFD/UFES

Dr. Amarílio Ferreira Neto Departamento de Desportos-CEFD/UFES

Wagner dos Santos

Mestrando do Programa de Pós Graduação em Educação na UFMG PROTEORIA-Instituto de Pesquisa em Educação e Educação Física

 

RESUMO

O  trabalho discute as abordagens teóricas de autores da Educação e da Educação Física sobre o saber docente, explicitando suas categorizações e formas de identificá-lo, na medida que é concebido como um saber formado por um conjunto de saberes. A experiência e o saber desenvolvido na prática destaca-se nas produções dos autores e o trataremos no contexto da escola, a partir de observações da prática de ensino dos professores, procurando evidenciar possibilidades e limites para tratarmos do saber da experiência dos professores.

 

1  INTRODUÇÃO

Os estudos que vimos realizando sobre o saber docente inserem-se num projeto mais amplo[1] que objetiva realizar discussões sobre o tema na Educação e na Educação Física pondo em relevo os periódicos catalogados no Catálogo de Periódicos de Educação Física e Esporte (1930-2000).

Considerando que a questão dos saberes dos professores tem de certa forma preocupado os pesquisadores brasileiros a partir de diferentes perspectivas e vem sendo explorada no campo da formação de professores, da didática e do currículo,[2] o estudo analisa as abordagens teóricas de autores da Educação e da Educação Física, objetivando sistematizar a discussão em torno do tema.

Nos Estados Unidos, as décadas de 1980 e 1990 foram marcadas pelo movimento de profissionalização do ensino, o qual foi iniciado e defendido por Holmes Group (1986 e 1990), Carnegie Fórum (1986), entre outros. Esses grupos lançaram um apelo aos pesquisadores universitários da área de ciências da educação para que se constituísse um repertório de conhecimentos para o ensino que pudessem garantir a legitimidade e eficácia da ação dos professores (Borges e Tardif, 2001, p.13).

Foi a partir dessa orientação profissionalizante que a questão do saber dos professores alcançou seu desenvolvimento e conduziu as reformas da formação docente (América do Norte, Europa e América Latina), colocando a atuação profissional em lugar de destaque na formação dos professores (Borges & Tardif, 2001, p.14).

No presente estudo o saber que os professores produzem na sua prática de trabalho, vem sendo destacado por autores da Educação e da Educação Física. Analisamos os modos de produção e os saberes que são produzidos pelos professores, aproximando-se do lugar no qual os professores atuam, ou seja, o contexto escolar e em especial a sala de aula.

Como coloca Oliveira (2001, p. 5):

Uma significativa parcela da produção acadêmica sobre a Educação Física escolar - seja de cunho historiográfico, didático-metodológico, formativo, etc. - enfrenta a discussão dos problemas adstritos ao espaço de atuação profissional do professor sem contudo, atentar para aquilo que os próprios professores pensam sobre o que fazem, como fazem, e por que fazem.

Nesse sentido entendemos ser relevante uma aproximação com o saber da prática dos professores para compreendermos de fato o que eles produzem no processo de ensino e aprendizagem, considerando-os desse modo a partir das suas próprias criações no contexto de trabalho.

 

2  OS SABERES DOCENTES NAS PRODUÇÕES DE AUTORES DA EDUCAÇÃO E DA EDUCAÇÃO FÍSICA

Selecionamos autores das áreas de Educação e Educação Física para refletirmos suas abordagens teóricas sobre o saber dos professores. Nas produções das referidas áreas, o saber docente tem sido considerado como um saber composto de vários saberes. Na tentativa de organizá-los, autores da Educação têm proposto diferentes formas de identificá-los, criando classificações e tipologias.

Tardif (2002) coloca que a questão dos saberes dos professores situa-se num contexto amplo do estudo da profissão docente, relacionando a sua situação à realidade escolar e social nas quais os professores estão inseridos. Por isso, aponta a necessidade de estudá-lo no contexto do trabalho docente.

Buscando estabelecer a idéia de uma articulação entre os aspectos sociais e individuais do saber dos professores, este autor procura distanciar-se de duas concepções: não reduzi-lo a processos mentais, baseando-se na atividade cognitiva dos professores, e não cair no sociologismo, o que eliminaria a contribuição dos professores na construção concreta do saber (Tardif, 2002).

Desse modo, baseia-se na origem social dos saberes, considerando os lugares nos quais os professores atuam, as organizações que os formam e/ou trabalham, seus instrumentos de trabalho, suas experiências de trabalho e sua trajetória pessoal de vida.

Para tentar dar conta do pluralismo do saber dos professores, propõe um modelo tipológico de identificação e classificação dos saberes:

 

Quadro 1 - Modelo de identificação e classificação dos saberes

RES DOS PROFESSORES

ES SOCIAIS DE AQUISIÇAO

S DE INTEGRAÇAO NO ALHO DOCENTE

es pessoais dos professores

a, o ambiente de vida, a educação itido lato, etc.

istória de vida e pela socialização a

es provenientes da formação r anterior

cola primária e secundária, os is pós secundários não ializados, etc.

ormação e pela socialização pré- ionais

es provenientes da formação ional para o magistério

stabelecimentos de formação de sores, os estágios, os cursos de gem, etc.

formação e pela socialização ionais nas instituições de formação fessores

es provenientes dos programas e didáticos usados no trabalho

ilização das “ferramentas” dos sores: programas, livros didáticos, ios de exercícios, fichas, etc.

utilização das “ferramentas” de o, sua adaptação às tarefas

es provenientes de sua própria ência na profissão, na sala de aula scola

ica do ofício na escola e na sala de i experiência dos pares, etc.

prática do trabalho e pela :ação profissional

 

Fonte: Tardif, 2002, p. 63.

Esse quadro demonstra, segundo o autor, que os saberes dos professores supõem um tempo para serem aprendidos e integrados na prática de trabalho, destacando a importância deste aspecto para a compreensão da genealogia dos saberes.

Gauthier et al. (1998), ao conceber o ensino como a mobilização de vários saberes que formam uma espécie de reservatório, no qual o professor se abastece para responder às exigências específicas da prática de trabalho, propõem uma organização baseada no contexto complexo e real no qual o ensino evolui:

Quadro 2 - Os saberes dos professores

Saberes disciplinares

A matéria

Saberes curriculares

O programa

Saberes das ciências da educação

As noções sobre o sistema escolar: conselho escolar, sindicato, carga horária, etc.

Saberes da tradição pedagógica

O uso

Saberes experienciais

A jurisprudência particular

Saberes da ação pedagógica

O repertório de conhecimentos do ensino ou a jurisprudência pública validada

Fonte: Gauthier et al. 1998, p. 29

 

 

Sobre o saber experiencial, consideram que as experiências profissionais estão confinadas à “jurisprudência particular dos professores” e têm relação com o hábito do trabalho e as atividades de rotina. Desse modo, o que sabem e fazem os professores serve para justificar o seu trabalho e a sua maneira de agir. Apontam assim uma limitação desse saber, pois sendo ele privado, sem uma comprovação sistemática como em outras profissões, não contribui para o aperfeiçoamento da prática docente (Gauthier et al., 1998).

Nesse sentido, criam o conceito de “saber da ação pedagógica”, no intuito de determinar um repertório de conhecimentos profissionais para o ensino, validado por meio de pesquisas realizadas em sala de aula, apoiando-se no saber experiencial dos professores.

 Dada a complexidade da prática educativa e suas permanentes tensões, os professores precisam decidir sobre as ações que se colocam. Os autores sugerem nesse momento, que o professor se apóie num corpo de conhecimentos que lhes dê “...um papel preponderante, apoiando-se naquilo que ele produz no exercício de sua profissão em contexto real, sem deixar de ser crítico em relação a esse produto” (Gauthier et a, 1998, p. 400).

Os saberes da ação pedagógica aparecem como um novo tipo de saber essencial ao trabalho docente, constituindo os “fundamentos da identidade profissional do professor”. Será a partir da validação por meio de pesquisas, que esses saberes poderão servir aos professores na sua prática pedagógica, como um reservatório de conhecimentos.

Os autores buscam desse modo a profissionalização do ensino, entendendo que, para esta ocorrer, será necessário a explicitação dos saberes dos professores e sua aceitação pelos outros atores sociais.

Caldeira (2001) também vem reconhecendo em seus estudos a complexidade e o caráter polissêmico da noção sobre o saber docente. Baseando-se nas produções de Tardif (2002) e Gauthier et a. (1998), indica que o saber docente cotidiano “está constituído tanto pelo conhecimento científico como pelo saber da experiência” (p. 98).

Refere-se aos “saberes docentes cotidianos” como aqueles construídos e apropriados pelos professores ao longo de sua trajetória profissional e pessoal, resultantes de sua prática, reflexão e experimentação. Distingue os saberes docentes cotidianos dos conhecimentos adquiridos em curso de formação inicial ou continuada, que se tentam aplicar à prática, bem como dos saberes concebidos a partir de um trabalho individual dos professores.

 Ao conceber o indivíduo da vida cotidiana como um sujeito que se constitui em diferentes contextos sociais e históricos, considera que seus saberes não emergem no vazio, mas em determinado tempo e espaço.

Desse modo, conceitua o saber docente como “...o conhecimento específico sobre o ensino que os professores, como sijeitos, constroem durante seu trabalho na escola. Portanto, é no trabalho cotidiano na sala de aula e no processo de reflexão sobre seu trabalho que os docentes se apropriam e constroem os saberes de que necessitam para desenvolver o processo de ensino-aprendizagem” (Caldeira, 2002, p. 6).

Nesse sentido, considera que o saber docente cotidiano é válido e necessário para diminuir a distância entre a formação acadêmica e a realidade escolar, propondo a superação da dicotomia teoria e prática nos processos formativos.

Na área da Educação Física, a temática vem sendo abordada por alguns autores que têm baseado-se nas produções teóricas da Educação.

Borges (1998) coloca a questão do distanciamento existente entre a formação acadêmica e a realidade escolar, como um ponto de partida para analisar o problema da fragmentação na relação teoria e prática, que ocorre nos cursos de formação de professores de educação física. Aponta o trato com o conhecimento como pano de fundo da problemática da formação, uma vez que os saberes são percebidos como resultado da produção científica, e alheios à formação dos professores.

Com base na idéia que a construção dos saberes têm origem em fontes diversas, a autora indica que a valorização dos saberes da experiência pode ser uma alternativa para se buscar um estreitamento dos vínculos da relação teoria e prática.

Borges (1998) considera a trajetória de vida dos professores de Educação Física, como um elemento de compreensão da prática pedagógica. O estudo dos casos de dois professores da referida área mostra os fatores que implicaram na construção do saber docente e na prática pedagógica dos mesmos: referências escolares e esportivas, conhecimentos adquiridos no curso de formação, experiências vividas nas instituições escolares em que atuaram e atuam, pessoas e grupos que marcam suas trajetórias, o lugar da educação física no currículo, entre outros.

Borges (1998) propõe que os processos formativos dêem legitimidade aos saberes da experiência, buscando problematizá-los no contexto da formação inicial, ouvindo os professores a partir de suas experiências acumuladas em suas trajetórias.

Almeida Júnior (2002) ao tratar da construção dos saberes na prática do trabalho, descreve e analisa o movimento de apropriação e produção do saber docente cotidiano na educação física, explicitando os saberes construídos durante o processo de ensino do esporte.

Destaca a importância do saber docente cotidiano na construção dos saberes, afirmando que os professores, ao utilizarem e mobilizarem os saberes que foram apropriados ao longo de sua trajetória profissional, têm a possibilidade de reavaliá-los, negando alguns e integrando outros à sua prática, produzindo desse modo novos saberes (Almeida Júnior, 2002, p. 4).

Nesse sentido, considera-se próximo das proposições elaboradas por Caldeira (2001) ao entender que o saber do professor é o resultado da sua experiência e experimentação, num processo de reflexão coletiva da prática, na qual se articulam a história social com a história pessoal do professor, bem como suas relações com os alunos e com os diversos sujeitos sociais presentes no cotidiano escolar.

Nas abordagens dos autores citados anteriormente, a prática é destacada como o lugar que os professores tem a possibilidade de desenvolver seus saberes, a partir de uma realidade concreta que lhes permitam mobilizar, utilizar, avaliar, reavaliar e experenciar saberes de sua profissão, criando assim os seus modos de fazer e ser frente ao ensino. Segundo esses autores, o contexto real do trabalho dá possibilidades aos professores de distanciarem-se de uma relação de exterioridade com os saberes disciplinares, curriculares e pedagógicos e construírem seus próprios saberes na medida de suas experiências.

Encontramos em Bondía (2001) considerações importantes sobre a experiência e o saber da experiência. O autor explora a possibilidade de pensar a educação a partir do par "experiência/sentido”. Ao sugerir pensarmos que a experiência não é o que acontece, mas o que nos acontece, distancia-se de algumas perspectivas:

  • A experiência precisa ser separada da informação, uma vez que, essa não é o “saber de coisas”, pois ao nos informarmos, sabemos de coisas que não sabíamos antes, mas nada nos aconteceu além de ficarmos informados.
  • A experiência é cada vez mais rara por excesso de opinião. A opinião tornou-se uma obrigação, um imperativo a partir da informação, anulando a possibilidade da experência e ocupando o espaço do acontecer. A opinião é uma reação subjetiva ao objetivo, a informação. Esse dispositivo torna impossível a experiência.
  • A experiência supõe um tempo, e esse tem sido raro frente à velocidade que caracteriza o mundo moderno, impedindo a conexão significativa entre os acontecimentos.
  • A experiência é distinta do trabalho. Nessa atividade de querer sempre estar mudando, fazendo, desejando, produzindo e regulando algo, encontra-se um sujeito cheio de vontade, sempre mobilizado e em atividade, que não pode parar. Não podendo parar para ‘sentir1 o que o cerca, também nada pode acontecer.

Ao salientar que nada acontece quando tem-se um sujeito da informação, da opinião, do trabalho, do fazer, do querer, do poder e do julgar, indica que a experiência tem outro sentido, ou seja, é o que nos acontece. Acreditando nisso, entende que o acontecimento é comum, mas a experiência é para cada qual singular e o saber que dela emerge “...é um saber que não pode separar-se do indivíduo concreto em quem encarna” (Bondía, 2001, p. 27).

 

O autor trata o saber da experiência como aquilo que "...se adquire no modo como alguém vai respondendo ao que lhe vai acontecendo ao longo da vida e no modo como vamos dando sentido ao acontecer do que nos acontece” (p. 27). O sentido ou o sem- sentido dado aos acontecimentos de cada pessoa tem relação com um saber “...particular, subjetivo, relativo, contingente, pessoal.” (p. 27).

Indica-nos portanto que para tratarmos do saber da experiência faz-se necessário, considerarmos a experiência de cada um, ainda que esta aconteça para duas pessoas, pois acredita que este saber “...não pode separar-se do indivíduo concreto em quem encarna” e não está “...como o conhecimento científico, fora de nós, mas somente tem sentido no modo como configura uma personalidade, um caráter, uma sensibilidade ou, em definitivo, uma forma humana singular de estar no mundo, que é por sua vez uma ética (um modo de conduzir-se) e uma estética (um estilo)” (Bondía, 2001, p. 27).

Nesse sentido, tratar das experiências dos professores e dos seus saberes na prática da escola, requer abordarmos pontos do contexto escolar que nos possibilitem reflexões acerca da produção do saber da experiência: o tempo na escola e as concepções de conhecimento da comunidade escolar.

 

3  SOBRE O SABER DA EXPERIÊNCIA E A PRÁTICA DA ESCOLA

Discutimos aqui a questão do saber da experiência na prática pedagógica, a partir de uma inserção junto aos professores de Educação Física atuantes na escola. As apreensões foram feitas no contexto escolar de uma Escola Municipal de Ensino Fundamental de Vitória-ES.

A escola funciona com 12 turmas, de 1a a 8a séries, em cada turno (matutino e vespertino). Em cada turno atuam 2 professores: um nas séries iniciais (ia a 4a séries) e outro nas séries finais (5a a 8a séries). Dos 4 professores que atuam na escola 3 deles são efetivos na rede de ensino e 1 contratado temporariamente. Cada professor trabalha com 6 turmas que tem 3 aulas semanais, perfazendo desse modo 18 aulas por semana. Para o planejamento das aulas, conta com um dia de trabalho na escola sem alunos e um grupo de estudos no qual são reunidos os demais professores das outras áreas e o corpo técnico escolar.

A relação dos professores de Educação Física com o programa de ensino da área marca um primeiro modo de produção de saberes. Cada qual, em sua trajetória profissional, vivenciou experiências singulares que o leva a perceber e tratar os conteúdos de formas diferentes e a partir de suas próprias concepções e convicções do sentido que um determinado conteúdo poderá ter na prática da aula.

No contexto observado percebemos que a trajetória profissional de cada um dos 4 professores que atuam na instituição influencia de algum modo na produção dos seus saberes.

O 1° professor tem envolvimento com treinamento esportivo dentro da escola (projeto extra-classe) e também fora dela. Ele traz no seu discurso e na sua concepção de ensino, elementos que revelam a proximidade com o treinamento de alto nível. Fica claro na sua prática de aula na escola que suas atividades trazem modos de ser que tem relação com a experiência de formar atletas, seja na preparação psicológica e de habilidades individuais, seja na preparação de um “espírito de equipe”. É desse “chão” de experiências que o professor constrói e reconstrói seus saberes no contexto da escola.

O 2° e 3° professores possuem uma trajetória marcada pelas influências das escolas nas quais já atuaram, assim como nesse próprio contexto (estão na escola há mais de cinco anos). Muitas são as relações vividas com diferentes profissionais que atuam e já atuaram nesta e em outras escolas. Também são vários e diferentes os projetos políticos-pedagógicos vividos em outras unidades escolares, colaborando para contruí-los e vivenciando-os. Essa “bagagem” permite-lhes avaliar e reavaliar saberes já produzidos assim como aqueles que estão sendo experenciados.

O 4° professor traz a atuação em academias de ginástica e o treinamento de alto nível na Ginástica Olímpica, como marca de sua trajetória. O professor está atuando pela primeira vez na instituição escolar (há quatro meses) e a construção da sua prática tem sido marcada pela aproximação dos seus pares e dos manuais didáticos que indicam atividades para crianças. Sua prática tem sido marcada por “experimentações” das informações apreendidas nos manuais e uma vivência num contexto novo e diferente, o qual traz possibilidades e situações novas para o desenvolvimento dos seus modos de fazer e ser.

No intuito de responder e corresponder ao programa de ensino e ao projeto político pedagógico da unidade escolar, os professores se orientam pelos conteúdos estabelecidos para desenvolverem suas práticas. Esses conteúdos são os saberes que a instituição supõe que os professores “sabem” e que seus alunos deverão “saber”.

Nesse momento percebemos a problemática da relação de “exterioridade que os professores mantém com os saberes” (Tardif, 2002). Os professores “sabem” esses conteúdos? Os saberes disciplinares são produzidos por eles? Ao supormos que os professores ensinam a partir do que sabem, o que sabem eles desses conteúdos produzidos por outras pessoas em outros contextos? Quais são de fato os seus saberes?

Os saberes dos programas, os quais deverão ser trabalhados pelos professores, na realidade são apenas “conhecidos” pelos mesmos e dependendo da relação estabelecida com os alunos, serão também meros conhecidos destes. Na atividade de aula os professores agem e reagem sobre esses saberes, avaliam e reavaliam esses saberes e assim, vão produzindo outros saberes que emergem de suas atividades na prática da aula.

Sobre essa realidade na qual estão inseridos os professores e onde produzem seus saberes, questionamos alguns pontos: como se caracteriza o tempo na escola? Como se dão as experiências na escola? Quais são os espaços de criação da escola? Quais são os sentidos das práticas na escola?

Nas relações dessa escola entre professor-aluno, professor-professor e professor- corpo técnico, a experiência perde espaço, na medida que a busca de sentido das atividades é quase sempre substituída pelo desejo de responder ao programa de ensino. O ano letivo é sempre marcado pela busca das orientações pedagógicas para o desenvolvimento das atividades. O espaço-tempo das reflexões sobre os acontecimentos dos anos anteriores e de práticas anteriores, é substituído pelo desejo de novas orientações para ver o trabalho “dar certo”. Qual o significado dado pelos professores às dificuldades das experiências passadas? Qual a relação dessas experiências com o novo ano letivo? No momento que, reúnem-se para planejar suas aulas, pouco espaço-tempo sobra para refletirem sobre o que fizeram e sobre o que poderiam fazer a partir do que foi feito, uma vez que, ocorrem demandas do corpo técnico, da comunidade e dos alunos para outras e diferentes atividades.

Os professores estão sempre com a “cabeça cheia de opiniões”, a partir das informações que obtiveram em cursos recentes, das novas dinâmicas de jogos apreendidas, sobre as novas demandas da infância e da juventude, enfim, sobre todas as informações que circulam no meio educativo e para o meio educativo, o que possivelmente os impede de realizar significativas conexões entre suas experiências.

Se os planejamentos e conseqüentemente as práticas não correspondem às demandas do tempo imposto pelo trabalho, os professores parecem sentir-se fora do tempo criado, alheio às suas experiências, surgindo desse modo, uma clara diferença entre aqueles que vão seguindo as novas teorias, as novas informações, as novas opiniões e as novas demandas de trabalho e os que constroem os caminhos a partir das necessidades e possibilidades da realidade no qual estão inseridos. Onde está presente nas práticas os sentidos do ensino de cada professor a partir de suas criações próprias no seu tempo próprio? O saber dos professores está ligado ao contexto de trabalho, mas não pode ser confundido com “trabalho” pois este limita as oportunidades de reflexão no cotidiano.

Percebemos desse modo que os professores dessa escola estão envolvidos em experiências de trabalho que deve responder e corresponder ao programa de ensino. Dessa forma os professores ficam possivelmente impossibilitados de sentir e dar sentido ao que lhes acontecem, pois devem corresponder principalmente ao tempo que lhes é imposto para realizar as suas atividades.

Para discutir o saber dos professores na prática da escola, será preciso considerar que o que acontece neste contexto é sentido, vivido e ouvido por diferentes professores, em momentos diferentes, com perspectivas e sentidos diferentes: será que as impressões sobre as dificuldades de aprendizagem dos alunos do professor de educação física, que trabalha numa perspectiva de treinamento nas suas aulas, é a mesma da professora que está em contato recente com o contexto escolar? E as outras professoras da referida área, quais serão suas impressões? Os conteúdos têm a mesma perspectiva e sentido para os quatro professores?

Essas particularidades e singularidades do sentir, viver e dar sentido ao cotidiano de cada professor na prática da escola, indicam- nos a possibilidade de pensarmos no saber-da-experiência-de-cada-docente, pois como coloca Bondía (2002) o saber está “...ligado à existência de um indivíduo ou de uma comunidade humana particular”(p. 27).

 

4  CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percebemos no quadro teórico apresentado que, tratar o saber docente requer ocupar-se de investigá-lo no contexto da prática de ensino no qual os professores vivenciam experiências concretas e tem possibilidades de dar sentido ao processo de ensino. Contudo é preciso atentarmos para as experiências e práticas que são construídas na escola, no sentido de analisarmos o que vem acontecendo em meio ao tempo que tem sido imposto aos professores, às concepções de conhecimento dos professores - muitas opiniões sobre muitas informações - e a freqüente necessidade criada no meio educativo de querer aproximar-se do "novo”, correndo o risco de perder a oportunidade de significativas conexões entre as produções já realizadas na prática escolar.

Faz-se necessário reconhecer também que, ainda que os professores vivenciem o mesmo tempo escolar, troquem experiências com seus pares, criem suas práticas no seio da coletividade da comunidade escolar e orientem -se pelo mesmo programa de ensino, produzindo dessas formas os seus saberes, estes devem ser considerados a partir da experiência de cada um, pois o saber da experiência relaciona-se à situação particular de cada indivíduo e necessita ser investigado a partir dessa perspectiva.

 

5  REFERÊNCIAS

ALMEIDA JÚNIOR, A. S. Saberes docentes e ensino do esporte na escola. In: ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO, 11., 2002, Goiânia. Anais... Goiânia: ENDIPE, 2002. 1 CD-ROM.

BONDÍA, J L. Notas sobre a experiência e o saber da experiência. Revista Brasileira de Educação, Campinas, n. 19, jan./, fev./ mar./ abr. 2001.

BORGES, C. M. F. O professor de educação física e o saber docente. Campinas: Papirus, 1998.

BORGES, C. M. F.; TARDIF, M. Apresentação. Educação & Sociedade, Ano XXII, p. 11­26, abr. 2001.

CALDEIRA, A. M. S. A formação de professores de educação física: quais saberes e quais habilidades? Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Campinas, v. 22, p. 87­101, 2001.

CALDEIRA, A. M. S. Saber docente cotidiano e processo de formação de professores. In: ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO, 11., 2002, Goiânia. Anais...Goiânia: ENDIPE, 2002. 1 CD-ROM.

FERREIRA NETO, A et al. Catálogo de periódicos de educação física e esporte (1930-2000). Vitória: Proteoria, 2002.

GAUTHIER, Cl. et al. Por uma teoria da pedagogia: pesquisas contemporâneas sobre o saber docente. Ijuí: Unijuí, 1998.

OLIVEIRA, M. A. T. Para uma crítica da historiografia: ditadura militar, educação física e negação da experiência do professor. In: FERREIRA NETO A. (Org.). Pesquisa histórica na educação vol 6. Vitória, ES: Proteoria, 2001. p. 5-48.

TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.

1

Segundo Ferreira Neto (2000), esse estudo pretende construir o itinerário de sistematização da(s) teoria(s) da Educação Física brasileira no século XX, de modo a captar suas características científico-pedagógicas, tendo como referência sua inserção, limites e contribuições para a implantação e consolidação da Educação Física como componente curricular nas escolas do Brasil.



[1]

[2] Cf. BORGES & TARDIF, 2001. p. 17.

 

 

Instituto de Pesquisa em Educação e Educação Física (PROTEORIA), http://www.proteoria.org
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Prévia do artigo AROEIRA, Kalline Pereira. As competências, diretrizes curriculares e educação física. In: SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIÊNCIA , 54., 2002, Goiânia. Anais... Goiânia: SBPC, 2002. 1 CD-ROM. LOCATELLI, Andrea Brandão. ; FERREIRA NETO, Amarílio ; VENTURIM, Silvana ; SANTOS, Wagner dos . A pesquisa com o saber docente na educação e na educação física. Motus Corporis (UGF), Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 63-83, 2003. Próximo artigo
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