APRESENTAÇÃO
Temos mobilizado um crescente contingente de jovens pesquisadores que satisfatoriamente vêm enfrentando os desafios e a beleza da produção da história/historiografia da Educação Física.
Caracterizamos este novo volume do Pesquisa Histórica na Educação Física como a continuidade – seja na ampliação, seja no aprofundamento de temáticas anteriormente discutidas – da aventura da cultura do livro, como bem nos lembra Roger Chartier em sua obra “A aventura do livro: do leitor ao navegador”. O livro como registro da história se constitui em uma das facetas do trabalho das universidades e revela seu comprometimento institucional e político-pedagógico em favor do conhecer o que fomos, o que somos e especular sobre o que poderemos vir a ser.
Ao trazer a público mais este livro, não seria demais reafirmar a seriedade e a qualidade demonstradas no conjunto dos textos que ao longo desses seis anos divulgamos. Sem dúvida, em muito vêm contribuindo para o estado atual da pesquisa em história da Educação Física. Freqüentemente, em dissertações e teses, há referências a nossa coletânea. Os co-autores que aqui se expõem com seus textos confirmam essa nossa constatação ao confiarem a divulgação de sua produção acadêmica a esse espaço.
Em “PARA UMA CRÍTICA DA HISTORIOGRAFIA: DITADURA MILITAR, EDUCAÇÃO FÍSICA E NEGAÇÃO DA EXPERIÊNCIA DO PROFESSOR”, Marcus Aurelio Taborda de Oliveira busca reconstruir, explicar e compreender como teria se desenvolvido a história da Educação Física escolar no Brasil, ao longo da ditadura militar. Cumpre seu objetivo por meio da memória dos atores da Educação Física no quadro sociocultural da década de 1970, confrontando suas impressões orais com seus registros escritos e o ideário dominante. O professor Marcus Taborda enfrenta como poucos o debate com a produção historiográfica da Educação e da Educação Física, demonstrando o seu caráter abstrato e autoconformador do modo de se construir a história e a historiografia recente em nossa área.
Embora com nuances teóricas, o texto de Francisco Eduardo Caparróz, “PERSPECTIVAS PARA COMPREENDER E TRANSFORMAR AS CONTRIBUIÇÕES DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA CONSTITUIÇÃO DOS SABERES ESCOLARES”, parte do pressuposto de que é necessário aprofundar a percepção e a reflexão sobre o que é estar dentro da escola, pois, se não compreendermos isso, dificilmente poderemos falar de contribuições para a constituição dos saberes escolares. Nesse sentido, o autor recorre a diversos trabalhos que centram sua discussão em torno dos desafios que precisam ser enfrentados para que possamos entender melhor o que é a Educação Física como componente curricular. Valendo-se das reflexões acerca desses trabalhos, procurou discutir como a produção teórica dos anos 1980 e 1990 tratou do desenvolvimento histórico do componente curricular Educação Física. Essa análise serviu de base para situar esse componente curricular no interior da escola, apontando as dificuldades, necessidades, limites e possibilidades que o contexto e conjuntura político-econômicos e sociocultural, na atualidade, impõem à Educação Física. Discute ainda a viabilidade de aproximarmos mais nossos olhares sobre a realidade escolar para superarmos proposições que não ultrapassam os limites de uma perspectiva idealista, pois, por mais espantoso que seja para muitos professores-pesquisadores de nossa área, a Educação Física existe no interior da escola e não fica esperando pelas respostas que o mundo acadêmico tem a pretensão de dar. Conclui que esse componente curricular existe e é real, e nós necessitamos conhecê-lo, se quisermos compreender quais são (têm sido) as suas contribuições para a constituição dos saberes escolares.
Kalline Pereira Aroeira & Amarílio Ferreira Neto, em “CURRÍCULO E EDUCAÇÃO FÍSICA NA REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE (1980-2000)”, põem relevo no eixo temático currículo em periódico. Esse estudo desenvolve discussões sobre o currículo, concebendo-o em um contexto que não o tem como algo dado e indiscutível, que raramente é alvo de problematização, mas como um conjunto de todas as experiências de conhecimento proporcionadas aos/às estudantes, como um núcleo do processo institucionalizado de educação, como um espaço de poder e identidades sociais. Com base na produção sobre currículo existente no periódico Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE), os autores indagam acerca do conhecimento corporificado no currículo: por que esse conhecimento faz parte do currículo e não outro? Por que alguns conhecimentos são considerados válidos e não outros? O ponto de inflexão aqui privilegiado contextualiza-se no entendimento de que a atuação dos professores em geral, e em especial de docentes universitários, está condicionada pelo papel que lhes é atribuído no desenvolvimento do currículo. A seleção de textos da RBCE contempla artigos que discutem o ensino fundamental, médio e superior.
Um dos períodos mais estudados da história e historiografia da Educação e Educação Física brasileira é, sem sombra de dúvidas, o interstício entre 1930 e 1945. Todavia, boa parte dessas publicações foram feitas lançando um olhar generalizante sobre aquele momento. O estudo de Júnia Sales Pereira, “JUVENTUDE, ‘RAÇA’ E EDUCAÇÃO FÍSICA EM BELO HORIZONTE NOS ANOS 30 E 40”, põe foco no local sem perder a articulação com os acontecimentos gerais da sociedade do tempo abordado. Por isso, discute as intenções e estratégias que, nos anos 30 e 40, pretendiam construir a imagem de uma juventude perfilada aos ideais do regime, tendo como recorte geográfico a cidade de Belo Horizonte e como estudo de caso o Ginásio Mineiro. O texto discute alguns pressupostos da Educação Física que consubstanciavam um campo discursivo recortado pelos ideais eugenista, sanitarista e nacionalista. Dessa forma, o que se pretende é transitar nesse campo discursivo de forma a entender suas dimensões, ampliando as ligações entre a promoção do discurso dirigente e as teias estabelecidas pelo social, a partir de um locus específico.
O último texto deste volume 6 é de Omar Schneider & Amarílio Ferreira Neto e tem como título “INTELECTUAIS, PEDAGOGIA E EDUCAÇÃO FÍSICA: CONTRIBUIÇÃO DE RUI BARBOSA, MANOEL BOMFIM E FERNANDO DE AZEVEDO”. Com o objetivo de apreender os discursos dos autores na materialidade com que foram elaborados, foi feito um questionário, no qual a preocupação central foi evidenciar: a) a concepção de ciência trabalhada pelos autores ou o que eles compreendiam como ciência; b) a concepção de Pedagogia e de Educação Física presente em suas proposições; c) o sentido da Educação Física na escola; d) o método proposto; e e) a dimensão da realidade a que as proposições estavam direcionadas. Essas questões são resultantes das indagações que nos inquietam em relação à composição do pensamento pedagógico brasileiro. São provenientes dos estudos que realizamos na pesquisa: A Constituição de Teorias na Educação Física no Brasil: o debate em periódicos no século XX.
Entendemos ser conveniente lembrar aos leitores que, nos volumes 1 e 2, recebemos chancela do Centro de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Espírito Santo, especificamente por meio do Laboratório de Estudos da Educação Física. Por seu turno, nos volumes 3, 4 e 5, fomos acolhidos pela Faculdade de Ciências Humanas de Aracruz. Somos muito gratos. Sem essas Instituições não teríamos chegado até aqui.
A partir deste sexto volume e até o décimo, seremos veiculados sob chancela do PROTEORIA. Trata-se de projeto de divulgação e pesquisa em Educação e Educação Física com sede na Universidade Federal do Espírito Santo que foi especialmente criado e é gerido objetivando a continuar dando seqüência a várias iniciativas por nós defendidas e encaminhadas ao longo de mais de uma década.
Nesses anos todos, priorizamos, sempre, formação científica, pesquisa, eventos acadêmicos e publicações. É a esses fins que o PROTEORIA vem contribuir para consolidação, agora, em versão ampliada e que possibilita a co-participação de pesquisadores e autores que possuam afinidade de atuação com o trabalho que nos dispomos e sabemos fazer.
Acreditamos que é por essa via de afinidade no trabalho de pesquisa que reunimos aqui as contribuições de Marcus Aurelio Taborda de Oliveira, Francisco Eduardo Caparróz, Kalline Pereira Aroeira, Omar Schneider e Júnia Sales Pereira.
Estamos todos nós convidados à leitura de mais este Pesquisa Histórica na Educação Física.
Vitória, outubro de 2001.
Amarílio Ferreira Neto
Organizador